O atual Ópio do Povo

Embora não concorde totalmente com a frase adiante, a retransmito para desenvolver o raciocínio pretendido: “a religião é o ópio do povo”. Teria sido escrita no século XIX por Karl Marx.

 

De fato, desde sempre, parte do povo foi “anestesiada” por discursos religiosos; entretanto, em todos os tempos sempre houve aqueles que viam e ainda enxergam na religião algo positivo, que eleva o espírito humano ao transcendental e a prática de condutas respaldadas moralmente.

 

Já na Grécia Antiga, os governantes para manter o povo “anestesiado”, sem se revoltar com os abusos de quem estava no poder, utilizavam-se da política do “Pão e Circo”. Esta consistia em manter o povo de “barriga cheia” e com distrações (entretenimentos) suficientes para evitar insurgências contra os governantes e seus ‘agregados’. Isso porque, de acordo com essa visão, se o povo está comendo e tendo algum tipo de diversão, como torneio de gladiadores, por exemplo, ele não sente a necessidade de voltar-se contra o status da elite.

 

Apesar de não ser um fenômeno exclusivamente brasileiro, focaremos o raciocínio em nosso território. Guardadas as devidas proporções, estamos vivendo um tempo de “ópio do povo” combinado com a política do “pão e circo”. Explico. Pão e circo porque há alguns anos não se tem notícia de crise alimentar no Brasil, diferentemente de décadas atrás quando faltava comida em partes do Brasil, sobretudo na região nordeste, em que pessoas morriam de fome.

 

Com a ampla disseminação descriteriosa da política de bolsas, como o Bolsa Família, não se tem notícias de brasileiros morrendo de fome [o que é muito bom]. Associado a isso, nos últimos anos fomos “agraciados” com grandes eventos esportivos, sobretudo a Copa do Mundo e as Olimpíadas, sem prejuízo de outros ‘espetáculos’. Resultado, o povo está anestesiado, pois tem pão e circo, levando a certa acomodação da população quanto à busca de melhoria na “qualidade de vida”.

 

No que se refere ao “ópio do povo”, o desenvolvimento das tecnologias em geral, entre as quais está a Informática, visam um bem aos seus desenvolvedores e, por consequência, à sociedade como um todo. Ou seja, se bem empregada, a tecnologia facilita a vida das pessoas e das instituições, como é o caso da rede mundial de computadores (internet).

 

Atualmente, 70% da população brasileira têm acesso frequente à internet, somado ao fato de que o número de linhas de celulares ultrapassa o número de habitantes. Boa parte das pessoas acessa a internet, e todas as suas facilidades (sites, redes sociais, blogs, etc.), por meio de smartphones. Até aí tudo ótimo. Acontece que inúmeras pessoas estão extremamente viciadas quanto ao uso ininterrupto destes aparelhos celulares, não conseguindo mantê-los desligados ou off-line, mesmo em situações extremas (como, por exemplo, durante celebrações religiosas; espetáculos teatrais; cinemas; sepultamentos; relacionamentos fraternais, afetivos ou íntimos; etc.).

 

Confesso, me interesso muito pela Tecnologia da Informação, de modo que já publiquei mais de duas dezenas de livros e artigos que envolvem pesquisas sobre a temática (veja www.tarcisioteixeira.com.br); entretanto, não consigo compreender que sensação é essa que estes smartphones e seus aplicativos provocam em muitos usuários. Parece um “anestésico” que paralisa a pessoa, de sorte que tudo o que vem da tela do celular parecer ser mais importante do que está acontecendo materialmente ao seu redor, ainda que a sua volta esteja: o seu filho querendo sua atenção; o seu cônjuge objetivando um pouco de romantismo no jantar; um maravilhoso espetáculo público; uma aula magna de alguém renomado; uma palestra de um mestre; etc.

 

Esse fenômeno está de certa forma eliminando o juízo crítico das pessoas, que não tem a oportunidade de ter um momento de ócio. Isso porque existe o chamado “ócio criativo”, isto é, os momentos em que o ser humano precisa de certo relaxamento para pensar, formar suas próprias ideias, enfim. Guardadas as exceções, meras manifestações na internet e redes sociais, sem conhecimento de causa, não podem ser consideradas como decorrentes de juízo crítico; ao contrário, são na maioria das vezes apenas um “efeito manada” (alusão ao fato de que, numa boiada, quando um boi vai para uma direção os outros acabam o seguindo).

 

Contudo, apesar de não ser algo que esteja acontecendo somente com os jovens, mas com eles em grande intensidade, estamos vendo a Tecnologia da Informação como o “ópio do povo”, que somado ao “pão e circo”, está acabando com a sensibilidade e o raciocínio do povo.